15 de abril de 2019

Que trata da primeira saída que o Pança fez como governante

O Príncipe decidiu aceitar o honroso convite do Conde de Nanterre para assistir às festividades do mui cristão povo irmão. Chamou o Pança para lhe comunicar os contornes da expedição a terras gaulesas: 
- Pança; apresentai-vos no trono.
- O que desejais, Alteza? – acudiu o Pança.
- Vou participar, como convidado de honra, nas festividades do condado amigo de Nanterre. Ireis acompanhar-me no duplo papel de meu escudeiro e de governador do teu condado.
- Meu mui digno patrono e amado Príncipe, Vós sois tão agradecido. Oh Deus! Abençoado dia que me fizestes escudeiro deste Senhor meu amo.
- Partiremos daqui a três dias, deveis empregar estes dias a preparar esta mui honrosa visita oficial.
- Ficai descansado, Senhor meu. Eu dedico o dever, assim como a alma, primeiro a Deus, depois a Vossa Alteza – afiançou o Pança; e não havendo mais a tratar, saiu depois de fazer uma vénia mui curvada.
O Pança não estava à espera de ensejo tão gostoso. No regresso a casa, conversava consigo mesmo e questionava-se por que é que o Amo não se tinha feito acompanhar pela marquesa, que tanto gostava de o acompanhar, e Ele de ser acompanhado por ela; por que não tinha optado pelo seu devoto vice; ou até pelo ilustre representante do Reino nas Cortes. Ia intrigado e eufórico para contar à sua amada esposa tão honrosa distinção.
O Príncipe reuniu com o Pança na véspera da partida para verificar se estava tudo em ordem e para dar alguns conselhos ao Pança sobre bons modos e comedimentos nos contactos com os gauleses, povo de fino requinte, merecedor de toda a nata da cortesia e de toda a flor das bem-criadas cerimónias. Recomendou-lhe que se esforçasse para se mostrar discreto, contido na fala e à mesa, pessoa mui assisada e cordata. Já na relação com o povo irmão, não achou o Príncipe necessário qualquer reparo - o Pança sabe movimentar-se, melhor que ele, entre iguais. O Pança asseverou, a Sua Alteza, que não receasse que ele se desmandasse, nem que dissesse coisas que não viessem bem a pelo, já que ainda não se tinha esquecido dos conselhos que há pouco tempo Sua Alteza lhe tinha dado, sobre o falar muito ou pouco, bem ou mal, comer pouco e beber menos.
Partiram. A viagem correu sem contratempos com o Pança sempre solicito a desimpedir o caminho a Sua Alteza. À chegada, o Príncipe reforçou as recomendações:
-  Sede cauto nesta primeira: faze gala da humildade da tua linhagem, Pança, e não tenhas desprezo em dizer que és filho de jornaleiro; ufana-te mais em seres humilde virtuoso, que pecador soberbo; não vos despeiteis, não vos metais onde não sois chamado e não deis conselhos a quem vo-los não pede.
- Procurarei fazer tudo conforme vossas sábias recomendações, Majestade, mas se me estiver a desmandar dai-me um sinal que logo porei remate a alguma tolice – afiançou o Pança.
O Príncipe e o Pança foram recebidos com pompa e circunstância pelos nossos irmãos e com muito donaire pelos gauleses. O Príncipe esteve soberbo, com muito donaire e nobreza. O Pança, sempre inchado e pomposo, não cabia em si de contente; foi discreto com os gauleses e igual a ele próprio com o povo irmão. Foi apresentado como governador de um condado do Reino, discursou no seu registo efusivo, distribuiu elogios e convidou o povo irmão para o próximo Festival da Fava, no seu condado. Depois, foi um mordomo de engenho alegre e desenfreado: distribuiu cumprimentos e cortesias, retratou e fez-se retratar, pôs-nos ao corrente daquela grandiosa jornada com retratos artísticos e mensagens eloquentes.
O Pança ficava por lá mais uns dias, seduzido como estava pelos atrevimentos lascivos das donzelas chiques desguardadas. Mas o Príncipe relembrou-lhe que estamos na quaresma  e que não poderiam faltar à Missa da Ceia do Senhor e Lava-pés.
                                                                                                      Miguel Saavedra

2 comentários:

  1. Pombal volta á idade média e o Príncipe parte com o seu fiel escudeiro para França???? Mau isto cheira a fim do Reinado...

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  2. Miguel Saavedra, sou um seu verdadeiro admirador, para quando a novela completa do: Príncipe, Princesa, restante Corte, Cura Vaz, e o Sancho Pança a gerir isso tudo lutando contra os moinhos de vento. Vá escreva as novela toda. O povo agradece.

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