27 de março de 2018

Que trata dos preparativos do Príncipe antes da sua partida para o retiro espiritual

O Príncipe adiou a partida para o Retiro Espiritual para poder mostrar publicamente que a tradicional fortaleza inimiga, esmagada na última contenda, está dominada e assimilada. Depois, mandou chamar o Pança para lhe passar as incumbências a cumprir durante o seu retiro espiritual, onde irá aprender os ensinamentos de S. Josemaria Escrivá: santificar o trabalho e a vida quotidiana; praticar a caridade, a humildade, a justiça e a paciência; cultivar a oração e a penitência; respeitar as opiniões alheias; ter uma família numerosa; não “ter uma vida dupla”; obedecer ou ir-se embora; aprender a dissimular ou a mentir.
Depois de uns dias de ausência, o Pança apresentou-se no trono folgado e desejoso de mostrar serviço nas artes de mandar. Começou o Príncipe:
- Como sabeis, Pança, partirei na próxima semana para o Retiro Espiritual, onde espero reencontrar a Graça de Deus e ser por Ele iluminado para cumprir a minha missão na terra e os altos desígnios a que me propus.
- Que nesse local sagrado, as estrelas fortifiquem a vossa divindade divinamente, os profetas do Senhor vos abençoai e vos faça merecedor do merecimento que merece a vossa grandeza, e, dessa forma, a nós também – desejou o Pança. E acrescentou: - muito gostaria de participar nesses encontros; e agora, que já me fiz governador de um condado, bem poderia Vossa Mercê meter uma cunha por mim.
- Parece que não aprendes, Pança; já te disse que estes encontros não são para gente da linhagem dos Panças.
- Não se exalte, Alteza. Era só para testar a sua bondade.
- Sois ingrato, Pança; bondade contigo é o que não me tem faltado…
- Desculpai-me, Alteza; eu cá não sou desagradecido, estou sempre às ordens de Vossa Alteza, a quem me liga minha obediência, para sempre, por laços comungais.
- Estais preparado para assumirdes a governação, na minha ausência?
- Não sou diplomado com o Senhor, ou o “Nanito”, mas tenho a escola da vida: aprendi com Vossa Mercê as praxes da cortesia e a saber usar a cenoura e o chicote; já sei pedir um favor, mas prefiro ordená-lo; já sei escolher o caminho mais curto, ou como chegar lá por desvios; e, se algo me escapa, uma vez sabido, sei como remediá-lo.
- Já sabeis bastante da arte de mandar, Pança; mas falta-te descrição e astúcia para não pareceres um fanfarrão que só diz pilhérias; modera vaidade, a ambição e a inerente maldade. 
- Cada qual é como Deus o fez. Mas não há só uma forma de tocar os burros; para mim, isso, hoje, é como comer e beber; e já aprendi que o porco que mais come é o mais calado. Ficai descansado: quem corre por gosto não cansa - é realmente agradável mandar e ser obedecido - não receie Vossa Mercê, meu Amo, que eu me desmande - afiançou o Pança.
- Assim espero, Pança. Mas árdua tarefa te deixo: tereis que meter os ministros e alguns dirigentes a trabalhar. No terreno não aparece nada feito. Os ministros aparecem-me nas reuniões de cabeça despida, boca aberta, sem dizerem palavra. Uma desligou; outra ainda não ligou (continua em tirocínio); as obras não andam ou andam tortas; o Jota não faz e o pajem ajuda-o.
- Ficai descansado, Senhor meu.
- Não poderei ficar, Pança; porque conheço-os bem: dizem sim a tudo, mas depois…
- Deixai-os aos cuidados do meu desprazer, Alteza. Saberei amarrá-los ao nosso despotismo; sei bem que a via da imposição e da autoridade é mais segura que a da astúcia.
- Não vos esqueçais de apertar com o Jota&pajem: quero a floresta limpa até ao final do mês - reforçou o Príncipe.
- Com a limpeza atempada da floresta não me posso comprometer, Alteza. O ministro Jota só pensa na jota (há eleições, agora - anda sempre em eleições), e o pajem, coitado, parece sofrer de manqueira.
- A lei tem que ser cumprida, Pança; se ele não fizer, faze tu – ordenou o Príncipe.
- Fazer, fazia; mas falta-me tempo…Má altura: tenho que me desdobrar por aqui e pelo meu condado, onde estou a organizar o Festival das Favas.
- Fazei como entenderdes; se a floresta não for limpa a tempo, alguém vai ficar com a fava. Ai vai, vai.
                                                                                                                 Miguel Saavedra

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