Um projecto maior da Liga Portuguesa Contra o Cancro afastou-me por meses deste blogue. Foi pela melhor das causas, posso dizê-lo agora. Ao longo do tempo fui comentando com os camaradas da farpearia a descoberta que esse movimento trouxe a Pombal: somos capazes de muito mais do que imaginávamos. "Afinal somos capazes de fazer coisas!", disse-me a Sílvia, certa noite, no I-Code, um dos vários bares da cidade que aderiu ao projecto Um dia pela Vida. E somos, sim. Para além da motivação maior que todos tínhamos (recordar os que partiram levados pelo cancro, celebrar a vida dos que o venceram e lutar ao lado dos que o enfrentam), quando integrei a comissão local dessa missão não poderia imaginar o que aqui viria, a comovente forma como a sociedade civil consegue emergir, quando abanada por causas.
O desafio da Liga era quase assustador: ligar as 17 freguesias do concelho, tão separadas à nascença. Ao princípio julguei tratar-se de uma missão impossível. Enganei-me. À medida que o tempo passou fui deixando cair décadas de certezas sobre o meu Pombal. Quando semana após semana se constituíam equipas novas (foram 84, no total, a maioria de 20 elementos) de voluntários, que haveriam eles próprios de implementar o projecto no terreno. Foram dezenas de palestras e acções de educação para a saúde, mais de uma centena de festas, de eventos de angariação de fundos. Mais de 110 mil euros angariados para a Liga, que os há-de aplicar no rastreio do cancro da mama e no apoio social aos doentes e famílias, cada vez mais preciso, cada vez mais notado.
Mas para além de tudo, a movimentação. A juventude a mexer. A capacidade de organizar, de mobilizar, de fazer acontecer. Nalguns casos os presidentes da junta estiveram ao lado das equipas, noutros foram a reboque, noutros perderam uma excelente oportunidade de ver como se faz. Um dia chegámos ao Carriço e havia 500 pessoas num almoço. Noutro a Palace Kiay abriu ao domingo à tarde para pais e filhos. Noutra ocasião duas equipas da cidade colocaram 700 pessoas num jantar. Em Vila Cã até a serra de sicó se transformou em palco. E as caminhadas, e os concertos, sempre a surpreender até a própria organização.
E o que dizer daquela malta que organizou uma edição da Voz de Pombal no Café Concerto (que precisa urgentemente de rever a organização de recursos...), trazendo à cidade uma explosão de talento. Sim, essa é uma parte que fica gravada. Pombal está cheio de talentos. Gente que toca, canta e dança tanto. E outra tanta que arregaça as mangas sem pudor.
Acredito que depois disto, nada pode voltar a ser como dantes. Não foi alheio a todo o sucesso desta mega operação a despartidarização que há tantos anos toma conta das organizações e as amarra entre muros. A Câmara fez o seu papel (cedendo espaços, meios e apoios diversos), num exemplo claro de como as coisas deveriam funcionar: há mais vida para além do município e do municipalismo.
E por fim, a festa de encerramento. A contragosto de algumas vontades (que insistiam na hipótese do Largo do Arnado), acabou por fazer-se no Jardim do Cardal (é municipal, eu sei, mas é muito mais nosso assim), num misto de emoções e milhares de pessoas a celebrar a vida. Provou-se que foi a melhor escolha. O Bodo podia ser assim, também. Ter uma componente social, tirando partido da gente boa que temos.
Às vezes é preciso dar a volta ao mundo para nos (re)encontrarmos no ponto de partida. Deixar os ciclos fecharem-se e ajudar a construir o futuro.
E sim, pela primeira vez, eu vi este povo lutar!
"E na epiderme de cada facto contemporâneo cravaremos uma farpa: apenas a porção de ferro estritamente indispensável para deixar pendente um sinal."
2 de junho de 2012
6 comentários:
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Amiga e companheira Paula Sofia, boa noite.
ResponderEliminarFico contente com o êxito do Projecto.
Não fico tão contente quando constato que o objectivo era angariar os 110.000 euros para mandar para Lisboa.
“E ver, pela primeira vez, este povo a lutar”.
A lutar contra quem? E contra quantos? Seres tangíveis, ou intangíveis?
Agora que encerrou, permite-me ser politicamente incorrecto.
Quem, como eu, acompanha há mais de dez anos a “enxaqueca” que levou a minha jovem esposa à sala de operações, para efectuar uma mastectomia e agora sofre as consequências dos tratamentos, não tem vontade de ir a festas.
São marcas indeléveis que ficam e que nos obrigam a viver um dia de cada vez.
Mas dei o meu melhor para a causa.
Abrindo as portas da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Pombal, colaborando activamente na sessão realizada na freguesia de Albergaria dos Doze, disponibilizando o palco para a Festa de encerramento do Projecto, o seu transporte, a sua montagem e a sua desmontagem.
Participei na caminhada, no Jardim do Cardal, no dia do encerramento e, para retemperar forças, bebi umas imperiais numa das muitas tasquinhas que lá montaram.
Agora só espero que ninguém tenha a ousadia de aproveitar, politicamente, o êxito deste Projecto.
Se tiver, tem-me à perna.
Beijo
Meu caro engº Marques,
ResponderEliminarVou começar pelo fim, porque já me parecia tarde...sabe o meu amigo qual foi, a meu ver, a grande chave do sucesso desta mobilização? O facto de todos os eventos se apresentarem despoluídos de politiquice. Quanto a isso, julgo que estamos conversados.
Parece-me que há aí algum equívoco sobre o destino das verbas.Tanto assim é que já fiz o favor de encaminhar estas suas legítimas dúvidas para a direcção do Núcleo Regional do Centro da Liga, cujo responsável o meu amigo conheceu bem, por estas paragens. estou certa de que a Liga lhe estará grata, como estamos todos nós, da comissão local, por ter facilitado o acesso a equipamentos de utilidade pública.
De resto, compreendo e respeito que a sua senhora não tenha vontade de ir a festas. Cada pessoa reage de forma diferente à doença, aos tratamentos e à vida depois das cirurgias, como tive oportunidade de constatar. Muitas são as pessoas que alteram a sua forma de vida. E muitas houve que foram as principais impulsionadoras das festas. Dentro e fora da comissão local. A prova disso foi aquela primeira volta dos vencedores, na manhã de sábado. Talvez não tenha tido oportunidade de ver, imagino eu.
Em suma, EU VI ESTE POVO LUTAR, sim. Contra o cancro, engenheiro. Felizmente e cada vez mais, estamos a falar do tangível, para felicidade das mulheres como a sua.
E desta vez sou eu que fico triste, pois não esperava de si uma interpretação dessas.
Muitos parabéns a todas as equipas que se mobilizaram no concelho para abraçar uma causa colectiva.
ResponderEliminarOlá!
ResponderEliminarParabéns a todos pela iniciativa e pelo êxito. A meu ver, o êxito foi o que foi precisamente por os colaboradores se apresentarem em tronco nu, relativamente a partidos políticos. Neste caso a sociedade funcionou com um partido único, " O PARTIDO DO CANCRO"
E a Liga Portuguesa Contra o Cancro agradeceu e pediu mais coisas do género.
ResponderEliminarAfinal de contas, Pombal contribuiu com uma verba correspondente ao orçamento da Liga para o apoio de doentes oncológicos durante um ano.
Só esperamos é que os doentes de Pombal que venham a precisar, possam usufruir um bocadinho, só um bocadinho dessa verba.
Quanto à mobilização foi boa... apesar de algumas vaidades...
Bom dia!
ResponderEliminarCaro Rafeiro no Pombal todas estas iniciativas funcionam com carolice, logo, a vaidade quanto baste é imprescindível e inseparável destas organizações.
Esta organização está vaidosa com o êxito