17 de fevereiro de 2014

Anatomia de um órgão: a Associação, os pais e os amigos deles


Há precisamente um mês, no dia 17 de Janeiro, o hall da Escola Secundária de Pombal fervilhou de actividade. Decorreu ali a eleição dos representantes dos pais e encarregados de educação do agrupamento de escolas de Pombal (esse monstro criado pelos organismos ditos competentes, que abalou a vida e a organização das várias escolas) para o Conselho Geral Transitório, com uma impressionante e saudável afluência de pais. A eleição acontecia depois deste post do Adelino Malho, daquela reunião em que também estive, e de tentativas feitas pela Associação de Pais no sentido de "eleger" ao estilo nomeação os quatro representantes, em reuniões posteriores.
Com a chegada de uma convocatória a casa de todos os pais - enviada por correio, em nome dos mais de três mil alunos - pareceu-nos (a mim e a outros pais igualmente críticos daquele modus operandi de uma instituição que se auto-elege, entre si) ver ali alguma reposição de igualdade e justiça. Dizia a convocatória - assinada pelos presidente das assembleias-gerais das duas associações de pais do agrupamento (há outra associação, na Redinha) que "as listas deveriam ser entregues até às 17h30". Assim fizemos. Pairaram dúvidas durante quase duas horas sobre a aceitação de uma lista de pais que não emanava das Associações. A presidente da Associação de Pais do Agrupamento - que também encabeçava uma lista para os representantes dos pais no Conselho Geral - tinha aproveitado a ocasião para reunir, ali ao lado da mesa eleitoral, os pais representantes das diversas turmas, de todas as escolas e níveis de ensino. Manifestou-se desde logo contra a existência de qualquer outra lista. Mais tarde, haveríamos de perceber que aquela atitude era um mal menor, perante o que estava para vir.
Com a confusão instalada, muitos pais acabaram por abandonar a Secundária sem exercer o legítimo direito de voto. Os que ficaram, assistiram ao momento em que a presidente da mesa eleitoral decidiu aceitar a proposta em causa, e dividiram-se entre 66 votos a favor da lista A e 58 da lista B, mais cinco brancos e três nulos.
E assistiram também ao momento hilariante em que a presidente da Associação quis votar duas vezes, e depois à cena final, quando rasgou o boletim de voto, à frente de todos. Só não assistiram ao rol de peripécias que ocupou o último mês, em que houve lugar para tudo, tentando impedir a todo o custo que as duas mães eleitas pela lista B nunca chegassem ao conselho geral. Vou dispensar os leitores do Farpas dos pormenores mais sórdidos e lamentáveis, por ter chegado à triste conclusão de que não há limites para a ânsia de poder. Chegámos ao ponto do Conselho Geral cessante receber duas actas: uma legitimamente redigida e subscrita pela presidente da mesa eleitoral, e também da mesa da assembleia geral da Associação de Pais do Agrupamento, e outra presumivelmente feita pela própria presidente da direcção da Associação, com um conjunto de assinaturas que a própria recolheu juntos de diversos elementos.
Esta manhã, os diversos membros eleitos para o Conselho Geral Transitório foram finalmente convocados para tomar posse, ao lado dos representantes de alunos, professores, pessoal não-docente, Câmara Municipal e outras entidades locais. Perante a novela em que se transformou o caso, ficam-me algumas dúvidas:
1. Haverá petróleo, ouro, ou outra riqueza escondida nas reuniões do Conselho Geral?
2. O que leva uma Associação de Pais e mover céus e terra para impedir que pais e mães comuns participem da vida das escolas e do agrupamento, quando seria de esperar alguma satisfação pela participação que é quase sempre escassa?
3. Vale-se a Associação de pais de um regulamento interno - que nunca foi aprovado em assembleia geral de pais, para considerar "não válida" uma lista de pais comuns. E por isso, estava pronta a eliminar essa lista, deitando fora o voto de 58 pais. Por que razão todos os outros membros são eleitos pelo método de hondt, e insiste a Associação na regra de maioria para a representantividade?
4. Se é certo e constitucional que quem elege também pode ser eleito, qual é o problema, afinal?

Por estes dias, tenho-me lembrado mais do que nunca das palavras do padre Ulisses, quando chegou à paróquia do Louriçal, em finais dos anos 70:
- não queiras ser muito beata...
Haveriam de passar muitos anos até lhe perceber, em toda a dimensão, a grandeza das palavras. Pregar a moral, a religião e os bons costumes é fácil. Praticar é que é pior.

3 comentários:

  1. Nunca pensei num pais dito democrático, a escola laica chega à politiquice ou à religiosismo. Nunca pensei no meio de adultos assistir a infantilismo. Nunca pensei que os pais se esquecessem do interesse dos filhos.

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  2. Também eu não pensava, Kari. Isto é tão perturbador que esta noite sonhei que um grupo de pais da lista que se considera única e válida tinha ido à Câmara, queixar-se ao presidente, numa lógica igualmente impensável de tráfico de influências. Felizmente acordei a tempo de perceber que isto mudou, e que Diogo Mateus não mistura as coisas nem as instituições, respeitando-lhes a independência e funcionamento autónomo. E que não há pais de primeira e de segunda linhagem...

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