22 de abril de 2024

Canções de Abril #22


O disco “Venham Mais Cinco” de José Afonso é uma obra prima. Gravado em 1973, todas as suas letras e músicas são da autoria de José Afonso, muitas delas escritas na prisão de Caxias. Os arranjos são de José Mário Branco e conta com a participação de músicos com origens e formações muito diversas. O tempo das baladas de Coimbra já tinha ficado, definitivamente, para trás. O que José Afonso propõe neste disco é de uma inovação e genialidade raramente vistas no Portugal de então.

O tema que dá nome ao álbum foi a primeira escolha do Capitão Santos Coelho para senha do 25 de Abril. Acontece que, já com tudo preparado, descobriu-se que essa música estava proibida pela Rádio Renascença, tendo a escolha alternativa recaído sobre "Grândola, Vila Morena". O resto é história.
 
"Venham Mais Cinco" é uma música icónica do trabalho de José Afonso. Ela expressa, de forma clara, a opção estética do autor, ao recorrer a ritmos de inspiração africana numa música de raiz portuguesa. A letra era, obviamente, muito incómoda para o regime fascista. Aparentemente, o poema refere-se a um conjunto de amigos que pedem mais cinco copos numa taberna. Acontece que, nesse ano, tinham passado cinco anos do início da "Primavera Marcelista", que prometia alterações políticas que nunca chegaram a acontecer. O famoso refrão - “Não me obriguem a vir para a rua gritar, que é já tempo d'embalar a trouxa e zarpar” - era um apelo claro à urgência revolta e um convite ao ditador para partir, o que viria a acontecer quatro meses depois, aquando do golpe militar de 25 de Abril de 1974.  
 
A versão de Ildo Lobo para "Os Tubarões", gravada no memorável concerto "Os Filhos da Madrugada", a 30 de Junho de 1994, no Estádio de Alvalade, constitui uma belíssima homenagem à obra de José Afonso e à vontade que o artista sempre manifestou de colocar em diálogo ritmos africanos e portugueses. É também uma oportunidade para lembrar os cantores africanos que tiverem um papel importante no combate à ditadura, como Ildo Lobo, Ruy Mingas, entre muitos outros.

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