7 de maio de 2014

Fala um dos fidalgos da Casa Varela


(foto tirada a 28 de Janeiro de 2013, em passeio pela invisível fronteira Passado/Presente/Porvir)

Sábado, 3 de Maio de 2014, estive no Celeiro do Marquês e fui de visita ao estado das coisas na justamente afamada Casa Varela. Levei notas, tirei outras. Delas V. ofereço aqui conta.

1. O convite foi duplo: do lado pessoal, Toninho Varela & Rui Cavalheiro; do institucional, presidente da Câmara Municipal de Pombal. Agradeci e anuí. Fui e estive.

2. O assunto era a Casa Varela. As duas perguntas motrizes eram: a) "Para quê?"; b) "Como?"

3. Vi coisas boas: o interesse genuíno de algumas pessoas no assunto e no futuro a dar ao assunto. Vi coisas reles: certa propensão para o protagonismo “umbiguista” e para o “tachismo” do costume. In loco, das coisas boas disse bem. Das más, disse mal.

4. Sem qualquer resquício de ironia da minha parte, devo dizer que uma das boas coisas a que assisti – sem qualquer ironia, reforço – foi o desempenho de Diogo Mateus. Admirável, direi mesmo. Geriu o encontro e o debate com total imparcialidade. Não opinou. Escutou todos, tirou notas. Dirão uns & alguns que “aquilo” na cabeça dele já está decidido, que o aparato da tarde de 3 de Maio foi só para fingir que sabe escutar, que tem em consideração as “bases”. Dirão outros que não, que ele quer mesmo auscultar os batimentos cardíacos para dar rumo ao diagnóstico. Eu digo que gostei da maneira como fez o que fez.

5. Das coisas más, direi mesmo que reles, foi a ânsia de certo “artistedo” de ópera-bufa (mais para o lado da bufa do que para o da ópera). Havia ali já “directores” da coisa em potência. Mas receio (ou estimo) bem que o tempo das anãs-pedros, por assim dizer, tenha passado. A não ser que eu esteja a ser ingénuo e esteja a fazer mal as contas. Talvez também eu precise que o Diogo me indique um revisor oficial. Mas isso é outra loiça.

6. Gostei do convidado de Óbidos; falou com saber de experiência feita e alhures vista. Concordo mil por cento com ele: estas coisas não dão fruto imediato. Mas se a próxima geração beneficiar de um ambiente cultural válido e efectivo, então a Casa Varela terá valido todo o investimento. Foi por isso que lá disse que “se este encontro tivesse tido lugar há, digamos, 20 anos, talvez nem o Projecto Jazz nem a Livraria K de Livro tivessem tido de fechar.” O espaço não tem de substituir as instituições culturais existentes: o ensino da Música, por exemplo, está muito bem entregue à Filarmónica Artística Pombalense e a Escolas como as do Luís Martins do Barrocal e do Luís Miranda, no Louriçal – meros mas bons exemplos. O espaço deve ser de encontro. De trabalho, não de emprego. Quem diz a Música, diz TODAS as artes que os Pombalenses dedicados a estas coisas amam, cultivam e querem expressar/mostrar. Não me venham é cá com bailarinas-de-corda e coisas que são cada vez mais rocha e menos loba.

7. Imaginemos, pois, que a Câmara, em vez de um hostel para os jot’idiotas, estimula um espaço rico e variegado fervilhando de actividades - fados naquela cave; cocktail-concertos naquele último piso; residências artísticas; criação de um cine-clube autónomo sem precisar de pedir licença à Assembleia Municipal para mostrar filmes alternativos à corrente blockbuster da porcaria das pipocas; sala com as fotografias do Pombal Antigo (que existem, não existem, Paulo Alexandre Silva?); Fernando Martinho com um piano do tamanho da nossa necessidade de ouvir pianistas; convidados de todo o lado; excursões-representações a todo o lado; etcíssimo.

8. Quase que tenho muita pena de ninguém me ter convidado para director daquilo. Mas só quase. Em cena, disse isto: “Apoiarei, como souber e puder, projectos com pessoas; projectos pessoais, nenhum.

9. E pronto. Tenho dito. Obrigado, Toninho & Rui; obrigado, senhor presidente da Câmara; obrigado, Lídia Carrola, por continuares tão bonita.

12 comentários:

  1. São opiniões, meu caro e querido amigo, professor, mestre.
    Sendo tua, tem um peso maior na minha ponderação.
    Mas confesso alguma discordância como ponto (meu) de partida. Talvez um preconceito, admito. Mas é que vejo espaços (tantos) tão bons, e sem projectos. Isto porque não conto como "projectos culturais" o aviar cafés ou servir de poiso às moscas... Auditório Municipal, teatro-cine, café concerto, (cafelaria do) castelo, celeiro do Marquês... E continuo a ver festivais de teatro bem alimentados pela carolice de TAP, mas com orçamentos patéticos, enquanto 2 filmes sobre o castelo (que eu nunca vi nem sei se ou onde estão disponíveis, a custarem mais de 10 festivais de teatro)... Acho que temos espaços bons (e) demais para tão pouca aposta nas pessoas e nas actividades. E temo estarmos a ajudar a dar à luz mais um elefante empregador e sugador de recursos, mas condenado ao abandono.
    Espero que o tempo te dê razão, toda, toda. E eu fique sem nenhuma e rotulado de velho do restelo. Seria bom...

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  2. Amigo e companheiro Daniel Abrunheiro, boa noite.
    Bem dizias tu.
    O seu a seu dono.
    Abraço, Grande

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  3. Quanto Daniel Abrunheiro dixit, está dito e normalmente bem. Ainda sou daqueles que continuo de pé atrás, quando oiço falar de cultura em Pombal. Para além dos esforçados artistas e intelectuais que ao longo de vinte anos têm sido preteridos, pela Exma Câmara, salvo raríssimas excepções, a favor de rimadores de pé quebrado populares, escrevinhadores de prosa laudatória populares, espalhadores de tintas e cores sobre vários suportes, muito habilidosos artesãos populares, mas não artistas, etc., etc., etc. pela inculta fauna camarária, como dizia, que fez regredir o Pombal cultural e social, mas engrandeceu e enriqueceu o Pombal da pedra, do betão e da arquitectura de fancaria, enfim, dos mestres e obras. Também eu, espero que o Diogo Mateus consiga exorcizar o fantasma que ainda assombra a Assembleia Municipal e comece a gerir Pombal à luz de um progresso real e sem "novos-riquismos" provincianos e incultos.

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  4. Errata: onde se lê mestres e obras deve ler-se mestres de obras. As minhas desculpas.

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  5. Revejo-me inteiramente nas suas palavras, professor!

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  6. Bom dia
    Caríssimos: opinião como a do Daniel ou de outro qualquer cidadão é sempre válida, no entanto, parece-me, há muitos espaços culturais para uma população que não têm hábitos culturais enraizados, por tal estão às moscas!

    Há muitas escolinhas de música .em Pombal e uma filarmónica, onde todos podem dar os primeiros passos na música. Nos conservatórios de música nem todos conseguem entrar.

    O edifício têm condições acústicas excelentes, logo, a câmara podia pedir uma extensão do Conservatório de Música de Coimbra e instalá-.lo no edifício,

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    1. Durante oito anos estudei no Conservatório de Coimbra. São cursos longos. E, inevitavelmente, tive que fazer inúmeras viagens e pagar a minha estadia naquela cidade. Inicialmente estive no Conservatório Regional, onde se cobravam propinas anuais elevadas. Passei depois para o actual, logo que abriu, e que funcionou em vários locais da cidade. Lamento que em Pombal não exista ainda um Conservatório e de ensino gratuito. Essa escola ė necessária por muitas razões. Entre outras, a questão da idade ideal dos alunos para iniciar estes cursos, que impede que estes se desloquem sós. Lembrei nesta reunião que a Escola hoje é também um espaço de cultura, aberta a muitas outras actividades das comunidades. Frederico Serrano

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  7. A população não tem hábitos culturais enraizados porque não tem ofertas culturais consistentes, regulares, previsíveis e divulgadas. Volto ao exemplo dos festivaisde teatro, com salas cheias. E em que a qualidade, em geral, tem o reflexo equivalente em afluência. O mesmo não acontece em iniciativas que surgem "como o peido", usando uma expressão de um amigo. Ou seja, que surgem sem avisar, quando ninguém está à espera!

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    1. Boa tarde
      Estou de acordo mas atenção: o teatro, arte da representação, ou se gosta ou não gosta, têm um público muito específico

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  8. Trata-se de formar público(s). Também lá foi falado.

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  9. Amigo Daniel, partilho inteiramente da tua opinião sobre o que devia ser aquele espaço, fado, musica, fotos, pintura, arte, teatro, cinema , tem tudo para ser um espaço diferente, uma coisa é ter espaços espaçados por Pombal, outra coisa é centralizar e ter um sitio que seja ecléctico, que seja para todos e todas as formas de arte, mas ainda dava para mais . Abraço

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