A política pombalense está possuída pelo Complexo de Édipo.
Existisse por aqui um Sófocles, e o actual o drama político daria uma bela tragédia
grega.
O complexo de Édipo é a designação que Freud atribuiu a um
fenómeno psicológico universal que observou em crianças neuróticas e normais, após
ter visto a representação da tragédia de Édipo do Rei, de Sófocles. Freud
caracterizou o complexo como um conjunto de desejos amorosos e hostis que as
crianças vivenciam na relação com a mãe e o pai, que lhes provoca enorme culpa
inconsciente e as leva a dirigir o primeiro impulso sexual para a mãe e o primeiro
ódio para o pai, ao ponto de desejarem matá-lo. De uma forma ou de outra, com
menor ou maior intensidade, o Complexo de Édipo acompanha-nos ao longo da vida,
e, se não for bem resolvido, nos primeiros anos de vida, pode tornar-se
patológico e desencadear verdadeiras tragédias. Freud observou também que a
tragédia do Édipo do Rei era apreciada por novos e velhos e por diferentes
culturas, o que indicava que o Complexo de Édipo era um fenómeno
universal.
Por cá, o complexo de Édipo manifesta-se porque o filho não
arrumou o passado - não esqueceu os desaforos do pai, recalcou-os. Daí à afronta ao pai, foi um passo. Afrontar o pai é um erro que transforma a
felicidade em infelicidade, por duas razões: primeira, a cultura cristã castiga
sempre quem afronta o pai; segunda, o pai nunca tolera a desconsideração e a desautorização,
e quando ainda está rijo, vinga-se. O caminho para a tragédia fica traçado.
O drama político pombalense assemelha-se a uma verdadeira
tragédia grega: prelúdio empolgante (que já se vive), mote conhecido de todos -
o filho que quis matar o pai, e o pai deseja vingar-se do filho – e epílogo
imprevisível.
A peça não terá, com certeza, grande unidade estética, mas
promete cenas empolgantes, como a do último fim-de-semana. Dois indivíduos de
carácter distinto, com diferentes estados de alma, entregues ao enigma do
destino, com culpa inconsciente e sofrimento imerecido, numa luta feita de coragem
e medo, resistência e poder, fugindo da punição e buscando a salvação. O enredo
promete muita transfiguração da realidade: peças alegóricas e doutrina cristã, sentimentos
piedosos e sentido aristocrático, moral prática e falsa moral ascética, briga política
e pessoal.
Os espectadores (o povo e o não-povo) não se limitarão a
assistir. Ser-lhes-á pedido participação activa na repartição da culpa e da
absolvição, na punição e na consagração, conforme o gosto ou a estirpe.
Uma coisa é certa: o deleite do povo está garantido.