Ao fim de anos de avanços e recuos sobre o que fazer da Casa Varela, a Câmara Municipal de Pombal (CMP) apresentou, em Agosto deste ano, o seu Director Artístico. Seria de esperar que, para além da circunstância do nome, algo mais fosse dito aos pombalenses. E a verdade é que foi, mas tudo passou nas entrelinhas.
O que há sabíamos.
1. A Casa Varela foi adquirida pela CMP sem que esta tivesse definido para ela qualquer programa. Com o menino nos braços, havia que dar um destino à coisa para poder justificar aos eleitores a pertinência de compra. E foram várias as propostas apresentadas: uma escola de artes e ofícios, um espaço para albergar uma loja do cidadão ou serviços municipais, um restaurante, um hostel, um espaço de co-working, um gabinete de apoio ao emprego e ao empregador.
2. Depois de uma reunião com os artistas locais em 2014 (já lá vão 6 anos; o Daniel Abrunheiro e o José Gomes Fernandes ainda escreviam no Farpas!), ficou no ar a ideia (ver aqui, aqui, aqui e aqui) de que a CMP pretendia destinar o local a uma casa das artes.
3. Em Janeiro, numa reunião camarária, foi assumido que a Casa Varela seria "um espaço de promoção e criação artística, performance e exposições" que "pretende abranger áreas culturais diversificadas, como a música, artes cénicas, pintura, escultura entre outras formas de arte, promovendo também trabalhos de experimentação e residências artísticas". Em coerência com essa proposta, a CMP decidiu abandonar a ideia do restaurante, optando por construir, no piso -1 do edifício, uma sala de ensaios numa tipologia de open-space, que também poderia ser destinada a exercícios performativos e espectáculos intimistas.
O que ficámos a saber
1. A grande novidade foi a escolha de Filipe Eusébio como Director Artístico da Casa Varela. O Filipe é uma pessoa dinâmica, com muita experiência na área teatral e com fortes ligações aos agentes culturais de Pombal. A sua escolha tem todos os ingredientes para agradar aos nossos artistas e, pessoalmente, desejo-lhe o maior sucesso nas suas novas funções.
2. O cargo de Director Artístico da Casa Varela é um cargo de confiança política. Se assim não fosse, não haveria razão para as suas funções terminarem nas eleições. Este facto compromete a autonomia de Filipe Eusébio, deixando-o refém dos humores do Presidente da Câmara.
3. Em declarações ao Jornal de Leiria, Diogo Mateus garantiu que no próximo Orçamento Municipal será contemplada uma verba de investimento e funcionamento anual, mas que, "num futuro a médio prazo, entre as várias possibilidades de modelo económico em estudo, está uma “fundação com pernas para andar”, com apoio mecenático, da comunidade e também da autarquia". Aqui está está uma belíssima forma de não se dizer nada! Mas, se atentarmos bem, o que Diogo Mateus nos quer dizer é que, da Autarquia, a Casa Varela apenas irá ter orçamento para funcionamento e pouco mais, remetendo para um "futuro a médio prazo" um modelo económico que viabilize a infra-estrutura.
O que gostaríamos de saber (e a nossa imprensa não pergunta)
1. A conferência de imprensa de apresentação de Filipe Eusébio foi totalmente dominada por Diogo Mateus. Esta opção deixa transparecer algo que merecia ser esmiuçado: o projecto artístico é da autoria do Presidente da Câmara ou do novo Director Artístico? Qual o contributo de pessoas como André Varandas (indignamente descartado pela Autarquia já depois da referida reunião de Janeiro) na elaboração do referido projecto?
2. Qual o modelo de gestão da Casa Varela? Qual a autonomia do seu Director Artístico (já sabemos que é pouca)? Será que todas as suas decisões terão que ser ratificadas pela vereação?
3. Será que a CMP, que já possui espaços como o Celeiro do Marquês, o Teatro-Cine, a Biblioteca Municipal, entre outros, necessitava de adquirir mais um edifício para cumprir as funções atribuídas à Casa Varela? Se a resposta é sim, como gostaria, subsiste a dúvida: qual a estratégia municipal para a cultura que permita dinamizar todas estas infra-estruturas? Qual o papel que a Autarquia reservou para os artistas no meio disto tudo: dinamizadores autónomos ou utentes subservientes?