Antes de partir para
fim-se-semana, o Príncipe chamou o Pança para lhe passar empreitada premente.
- Pança? Vinde cá, meu
servo diligente.
- Que me ordena Vossa
Grandeza?
- Que ponhais em prática empreitada mui valorosa,
neste fim-de-semana – afirmou o Príncipe.
- Às suas ordens,
Alteza. Só espero que não seja muito volumosa – advertiu o Pança. Como sabeis: agora,
tenho, também, que dar atenção ao meu condado, e não me posso descuidar, que nisto
de governos tudo está no começar bem.
- Pança; sabeis bem
quais são as tuas obrigações como escudeiro…, não me obrigues a relembrar-tas…
- O Senhor meu Amo
poderá ficar descansado – bem sei que ficar às ordens de Vossa Alteza é meu
dever de escudeiro…
- Temos que entrar na
pendência pela corporação florestal, apear o Ferrador e arranjar alguma coisa
para ir ocupando a condessa das Cavadas – ordenou o Príncipe.
- O apeanço do
Ferrador só peca por tardio; mas achai Vossa Mercê que a corporação florestal é
lugar para a condessa das Cavadas? – Perguntou o Pança, surpreendido com os
planos do Príncipe.
- Não sei, nem isso
importa para a circunstância; porque perguntas, Pança? Sabeis bem que ela teve
a pasta das florestas, e parecia gostar daquilo…
- Vossa Mercê sabe
muito bem que ela parece gostar de tudo o que lhe dão – se há defeito que não
tem, é ser esquisita. Mas se Vossa Mercê a quer presentear com alguma coisa de
valor, por que não a mete a presidir à Escola? O doutor meteu aquilo numa rebelião
tal, e num emaranhado de processos judiciais, que não tem fim à vista. Como
Vossa Mercê sabe, a condessa é uma boneca de génio mole que derrama doçura;
talvez acalmasse aquilo…
- Pança; não te metas
a dar pareceres a quem não os pede… A conquista da corporação florestal permite
apear o velhaco do Ferrador – um vilão de duas faces, que se diz connosco mas está
apegado aos nossos inimigos – e ocupar a condessa.
- Mas acha, Vossa
Mercê, que a condessa quer aquilo: uma incumbência que só dá trabalho e
chatices?
- Enganas-te, Pança;
também dá proventos, e não são despiciendos; conheço bem as contas – sou o
guarda-livros – e as artimanhas do Ferrador…
- Já não está cá quem
falou…Lembrei-me, agora, que também participei numa reunião onde falaram disso,
e fizeram ameaças…- recordou o Pança.
- Digo-te mais, Pança:
a condessa ficará por lá pouco tempo, porque brevemente substituirá a marquesa
Prada, que já deveria ter renunciado, mas continua a engonhar e a criar-me
desavenças desnecessárias.
- Percebi, Majestade.
Mas dizei-me: com quem posso e devo contar para empreitada tão dificultosa?
- Tens muito por onde
recrutar, anda por aí muito vassalo ávido de poder – afirmou o Príncipe.
- Tem razão, Alteza;
anda por aí muito vassalo desavindo com as lutas pelo poder - nunca vi o
partido tão partido…
- Para quem domina a
arte de reinar, nada melhor – lembrou o Príncipe.
- Pois; mas Vossa
Mercê dá-me cada empreitada mais dificultosa…. Pensa, Vossa Mercê, que o
trabalho de manejar ódios e encadear vinganças, para o mesmo propósito, é
rendilhado simples...
- Não é, Pança; mas é
campo onde cavalgas sem rédea.
- Sim, mas dizei-me,
Alteza: o Senhor acompanha-me? E com quem posso contar para esta refrega?
- Estou fora dessas
brigas… Deixo isso para os vassalos desavindos se guerrilharem. Vieram, também,
convidar-me para tomar conta do partido…Rejeitei. Chega-me o poder que já tenho;
e gosto de ver, de fora, essas guerrilhas menores.
- Compreendo, Alteza;
mas sem o Senhor esta conquista fica mais difícil. Preciso que me arranje cavaleiros
valorosos…
- Tens-te a ti, Pança;
a condessa, agora liberta de ofícios; o trinca-ferros, sempre disponível por brigas
pelo poder; o beato Ilídio, que quer aparecer para não ser esquecido; …
- Fraca tropa,
Alteza! A macieza que o beato Ilídio tem a mais, tem o trinca-ferros a menos.
Já não falando do mau agouro que o trinca-ferros transporta - quando entra nestas
pendências, onde é preciso contar votos, geralmente perdemos…
- A quem o dizes... Mas deixa-te dessas lamúrias, Pança. Bastará aparafusardes a vossa
coragem até ao ponto máximo, para que não falhemos.
- Eu dou sempre tudo
pelo meu Amo; e tanto me atiro a eles de frente como a rebolar…
- Acredito; mas
não te
esqueças, Pança, para vencer a malícia, malícia maior tendes que ter – alertou o
Príncipe.
- Ficai descansado…Sou
escudeiro que aprendeu depressa, com Vossa Mercê, os artifícios da malícia.
- Faze bem esta incumbência,
que tenho mais para ti – prometeu o Príncipe.
- Darei tudo…Mas Senhor
meu, tende sempre mão em mim…
Miguel Saavedra
O Nobre povo estava hoje em reunião com um Conde do Oeste, estariam a serrar algo de novo ? Ou a Ferrar alguma ?
ResponderEliminarCom tão viçosos produtores florestais, há esperança para a floresta pombalense.
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