- Bons
dias, colegas.
- Bom
dia.
- Bom
dia.
- O
jardim da coroa está mui desleixado…- atirou a almeida
- Não tendes
folhas para apanhar? – respondeu o mestre-jardineiro.
- Ai!
Não me faleis assim… Não vos mostreis tão aziados com esta vossa pobre colega –
respondeu a almeida.
- Desandai…E
deixai trabalhar quem muito trabalho tem para fazer – atirou o
mestre-jardineiro
- Sim,
tendes muito que fazer para fazer disto um jardim …- retorquiu a almeida.
- E tu
tendes muita folha para apanhar por essas ruas e passeios – replicou a
jardineira.
- O tempo
encurta a minha empreitada, já vós não tendes a mesma sorte – replicou a
almeida.
- Cada
um sabe de si e Deus de nós todos – retorquiu a jardineira.
- Tendes
as pedras cheias de caruncho, as seves arruinadas, as árvores com ninhos das
vespas asiáticas, as roseiras cheias de lagartas, os canteiros em grande
desordem e cheios de ervas daninhas... – atirou a almeida.
-
Cala-te! Sabeis bem quem é o responsável de tal desordem…Sabeis bem que não
temos quem nos oriente – afirmou o mestre-jardineiro -; e prosseguiu: - agora,
entregou-nos a um mancebo demasiado jovem para saber o que quer, que nunca
pegou numa enxada, nem sabe distinguir um amor-perfeito de um malmequer.
- O Príncipe
tem pecado muito… Deixou-se rodear por muita espécie que não dá frutos, e não tem
suprimido os ramos parasitas para que os outros deem frutos... –
afirmou a almeida.
- Já
chega dessa conversa…- afirmou o mestre-jardineiro.
-
Mudemos, então, de assunto – atirou a almeida. Vistes passar a primeira-dama? E
prosseguiu: - saiu, há bocado, do convento, e logo a seguir saiu o padre Vaz,
deve ter ido ao confessionário…
- Vi,
sim – anuiu a jardineira. Nem a reconhecia, pareceu-me muito atormentada.
- Parece
mirrada – afirmou a almeida.
- Estará
doente? – perguntou a jardineira.
- De desgostos,
ouvi dizer… Ai, cala-te boca – rematou a almeida.
- Pobre senhora
– exclamou a jardineira.
- Parece
desorientada; por onde passa, proclama, sem rodeios, seus males... – contou a almeida.
- Credo!
Livrai-nos, Senhor, de desaforos, maus-olhados e outros que tais – afirmou a
jardineira.
- A quem
o dizes, colega! – rematou a almeida.
- Sabes quem
passou por aqui, ontem? perguntou a jardineira.
-
Conta-me, conta-me …rogou a almeida.
- A
marquesa! Ao tempo que não a via. Olha, nem a conhecia! Pareceu-me acabrunhada.
Disseram-me que esteve de baixa, com a maleita do abatimento, coitada – contou
a jardineira.
- Não
tenho pena dela – afirmou a almeida. Pensam que, por ser fidalgas, nem o vento
lhes toca, mas toca! Quando perdem o pé caem como as outras – afiançou a
almeida.
- Há
gente que prega o jejum, mas gosta de comer à grande e variado – rematou o
mestre-jardineiro. Cala-te boca.
Miguel Saavedra
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