10 de novembro de 2019

Faz de conta que nos importamos com a cultura local



À hora marcada, atravessei o Cardal até aos claustros da Câmara. Estava agendado para as 17 o lançamento do livro da Maria Luís Brites, que o município 'gentilmente' colocou no programa de 'comemorações' do 11 de Novembro. Decidiu juntá-lo a uma exposição de pintura de Armando Rocha, sendo que escritora e pintor nada têm em comum, tão pouco se conheciam. Era preciso preencher o programa e calhou mesmo bem. Quem entrasse nos Claustros na tarde de sábado, ficava a saber o mesmo: não houve direito a apresentações para ninguém. Mas adiante. Ainda bem que os meninos da Filarmónica da Guia tinham um bom repertório preparado, pois que o (pouco) público e protagonistas do momento tiveram de esperar uma hora para começar a apresentação: à espera do Presidente.
O momento - que me era feliz, à conta de ver ali a Maria Luís inteira, a equilibar-se no alto dos 85 anos - foi surreal. É certo que ela dispensou alguém que a apresentasse e dissesse dela ou do livro qualquer coisa. Mas à Câmara só ficava bem, pelo menos, ter o respeito e a simpatia de apresentar o momento. A Maria Luís Brites não é uma mulher qualquer. Se não fosse pelo mérito enquanto escritora (e pelo facto de ter sido a única mulher candidata à Câmara, embora, lá está, por partidos que não interessam), que fosse pelo muito que fez aos microfones da Rádio Clube de Pombal, quando nos anos 90 percorria todo o concelho de Pombal numa carrinha, à procura de dar voz aos autarcas e às populações. Mas isso foi uns anos depois de - num dia do Município, precisamente - ter tido honras de apresentar o livro 'Um triângulo no Litoral' para uma sala cheia. Outros tempos.
Como só ela, apresentou o livro sozinha e pediu logo perguntas ao público. E ficou para o fim o 'encerramento' (erro de protocolo, João. Tenho um livro da Isabel Amaral em que ela explica muito bem estes pormenores, vou emprestar-to) a cargo do Presidente da Câmara. Foi aí que aquilo me fez lembrar o tempo de Narciso Mota, em que, estranhamente, Diogo misturou alhos com bugalhos, embrulhando tudo num discurso redondo sobre as obras (literárias) que a Câmara já promoveu este ano, como que a metro. Sem esquecer a referência à distinção já feita à Maria Luís no rol de medalhas. E pronto, cumprido o programa, já pode voltar a encher a boca para a oposição com este feito notável que é promover a arte dos que até são do Bloco de Esquerda.
O que aconteceu este sábado, nos claustros, devia fazer corar de vergonha quem valida este faz-de-conta. Mas não faz. Está tudo bem. Tudo bem.
Já a sessão de autógrafos tinha terminado quando apareceram os amanuenses com uns ramos de flores, aquele mimo e cortesia que habitualmente se entrega aos escritores logo que terminam de falar. Foi a cereja no topo do bolo, exemplo maior das peças de puzzle que não encaixam mas...fazem parte. 
Enquanto assistia àquele momento - que a Maria Luís merecia tivesse sido de muito maior dignidade (e isso não tem nada a ver com solenidade) lembrava-me da biblioteca que quis doar ao município. Eu mesma enviei a Diogo Mateus um sms, na semana antes do Natal de 2018, dando-lhe conta dessa vontade. Foi numa manhã em que lá estive, em casa dela, a fazer-lhe uma entrevista de vida para o DN. Sei que mandou outros recados. A minha mensagem nunca teve resposta. Os recados também não. Afinal, o que é que isso interessa?

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