Pessoa afirmou-o e eu repito-o: “Tudo que se passa
no onde vivemos é em nós que se passa”. É uma verdade que nos entra pelos
sentidos e se aloja na alma. Nesta pobre terra, em decadência, que é a nossa,
ainda é mais assim.
O que se passa aqui dói. Dói a pobreza franciscana
que nos afecta; e dói o amolecimento moral e o falso moralismo que a suporta.
Vive-se, aqui, neste lago de águas paradas - habitat ideal para os oportunistas
e os manhosos - uma vida social dormente, indolente, insípida. Valoriza-se o
fraco, o pobre, o profético. Perdeu-se a distinção humana entre o falso e o verdadeiro,
entre o grandioso e o medíocre, entre a verdade e a mentira, entre decência e
indecência.
Este caldo de cultura afecta as nossas vidas mais do
que se supõe. O desfalecimento gradual da economia do concelho – a morte da
agricultura, o adiamento da industrialização, a queda abrupta da construção, o
soçobro lento do comércio e dos serviços - é, talvez, a consequência mais
nefasta e visível. Mas a ausência de força criadora, de actividade artística,
de cidadania activa é preocupante. Esta terra não vai cumprir seu ideal:
concelho charneira. Temos sido dirigidos por gente sem energia e sem rasgo, por
“pobres-diabos sempre com fome - ou com fome de almoço, ou com fome de
celebridade, ou com fome das sobremesas da vida”. Uns vorazes, outros
simplesmente à procura da maça-do-chão; gente ávida de protagonismo, de dirigir
qualquer coisa ou coisa nenhuma. E temos muito povo manhoso, à espera da vantagem
em relação ao vizinho, da esmola cada vez mais escassa.
Acusam-nos de dizer mal de tudo. Não é verdade. Não
somos capazes! Quanto mais vemos, mais há para ver. A realidade não pára de nos
surpreender. Quando levantamos mais uma ponta de um véu, sentimos vómitos, e,
às vezes, provocamos um vómito para aliviar a vontade de vomitar. Continuamos a
olhar para a triste realidade porque deixar de ver também faz doer os olhos.
Bem sabemos que o antibiótico da denúncia, mesmo aplicado em dose forte, não
mata este vírus multi-resistente, mas ajuda a conter a propagação.
Comemoramos o 11.º aniversário no pico da notoriedade
e penetração. Fazemo-lo com um sentimento doce e agro: o nosso sucesso é um insucesso
de muita coisa e muita gente - não é necessariamente
um bom sinal colectivo.
Nunca corremos atrás de elogios ou palmadinhas nas
costas - deixamos isso para outros. Não espero - não esperamos - que nos compreendam,
só que nos leiam. “Repudiei sempre – como diz Pessoa - que me compreendessem.
Ser compreendido é prostituir-se. Prefiro ser tomado a sério como o que não
sou, ignorado humanamente, com decência e naturalidade”.
Caro Malho, parabéns pelos 11 anos do Farpas que cada vez vai incluindo mais participantes de diferentes opiniões políticas a demonstrar que há muito boa gente que gosta de debater a política, que nos comanda, num ambiente tolerante e amistoso, como aconteceu em mais este jantar comemorativo.
ResponderEliminarComo eu já referi, pode ser esta diversidade a responsável por um crescimento do blogue onde tanto se pode afirmar a critica mordaz como a menos mordaz e por vezes até confrontante, e não só crítica, a aportar mais democracia ao nosso meio.
Sobre a atividade apreciada, e o seu lamento, do nosso Pombal julgo que é uma observação lúcida que se percebe, embora já nas causas possamos não estar de acordo.
Para mim o fundamental do problema está em três vertentes:
1 - Entalados entre dois concelhos capitais de distrito que oferecem oportunidades melhores aos nossos habitantes que lá vão trabalhar e muitas vezes até lá passam a residir e/ou investir;
2- outra vertente está no país pobre que somos onde crescer é mais difícil e
3- a terceira reside talvez nos valores da nossa sociedade local que prefere emigrar do que trabalhar e investir no concelho, e assim, por melhor que seja o Cheff, sem os melhores ingredientes, não se confeccionar um prato de qualidade a sério.
Caro Manuel Serra: Não, a nossa comunidade não "prefere" emigrar. Tem de o fazer, porque aqui não vê por onde possa ficar, empregar-se, estabelecer-se. Sobre o resto, não é o facto de estarmos "entalados" entre dois concelhos capitais de distrito. Isso deveria ser uma força e não uma fraqueza, como foi no passado, nas décadas de de 70 e 80, lembra-se? ou como é que foi que nasceram aqui as zonas industriais? O problema, é que com essa tradição de "cumprir calendário", achamos que basta. O problema - maior, na minha opinião - é que nenhum dos autarcas dos últimos 25 anos pensa cá ficar, depois fechar a porta. Não sente a terra, não a vive, de facto, e por isso é muito difícil fazê-la levantar-se do chão.
EliminarCara Paula Sofia
EliminarRespeito a sua opinião mas mantenho a minha.
As capitais de distrito, em tempo de vacas magras, atraem muito do que poderia vir para o concelho mas que por lá fica.
E se a responsabilidade fosse principalmente dos autarcas seria muito fácil resolver a questao e não é.
Porque por mais que se sinta a terra o se viva a dita, sem oportunidades reais e quantificáveis nenhum autarca resolve a questão.
Agora, devemos porfiar para conseguirmos o que desejamos, isso devemos interessando-nos cada vez mais por essa causa, apesar dos autarcas poderem não ser ao gosto de todos.
Continuação, é grande e só lê quem quiser...
ResponderEliminarPensarão: Lá está o Serra a desculpar alguém metendo todos ao barulho...mas de facto repare-se:
Nós, quando emigramos, somos dos melhores nas iniciativas e na determinação, deixamos saudades em todo o lado por onde passamos, e porquê?
Julgo que o desenraizamento estimula a nossa criatividade, a nossa solidariedade e atividade.
Na nossa terra ocupamo-nos muito com as extremas, o quintal do vizinho e também com o comportamento alheio, e isso desgasta-nos e essencialmente desajuda-nos a todos.
A proliferação de coletividades e festas, se não servirem para agregar todos num sentido produtivo podem apenas acabar por agir como lenitivo confortável dos insucessos crescentes.
Na nossa terra sofremos todos do síndroma do D. Sebastião que chegará numa manhã de nevoeiro para resolver todos os nossos problemas e daí as expetativas políticas a cada eleição que “agora sim” será um messias malabarista que irá transformar a expetativa em realidade, a habitual preguiça em diligência enfim, a pobreza em riqueza para todos…
E no final é mais um igual aos precedentes que intervem mas não faz milagres.
Talvez seja essa esperança bacôca de cá, que não acontece lá fora, que nos tolhe os movimentos e nos condiciona o nosso futuro.
É que remetermos sempre as nossas desventuras para os dirigentes reconforta-nos a indignação, acalma-nos as tristezas, mas não nos resolve a vida…. Essa só com determinação e ação de todos e cada um de nós.
Sinceramente não sei como se deve agir perante isto, mas quer-me parecer que uma aposta na educação de qualidade, alguma mudança das mentalidades e aí sim, atenção dos governantes ao seu estímulo e facilitação das iniciativas, poderá ser a "pedra de toque" para aquela pujança social que desejamos todos ver neste concelho.
Se esta for a solução, então cabe-nos a todos defender e estimular este azimute, para o qual obviamente devemos chamar a atenção dos dirigentes...
Aliás aqui fica também o alerta para as movimentações recentes de Leiria em , Monte Redondo com a criação do já anunciado parque industrial, ao qual Pombal deverá responder sem demoras ampliando o já saturado parque industrial da Guia. Creio que a nossa câmara está atenta e espero que a nossa junta não se distraia.
Mas se estas não forem as razões principais pelo menos adiantei uma tentativa de explicação e ação.
Ainda sobre o 25 de Abril e a liberdade e a censura, há uns, como eu que a utilizam sem receios e assim homenageiam essa liberdade ativamente. Outros, por opção impõem-se a auto-censura, que é de respeitar mas que pouco contribuem para o coletivo…
Façamos da esperança o nosso lema e continuemos contribuindo, como pudermos, para atingirmos aquele Zénite desejado que se pretende a bem de todo o nosso concelho.
Ainda havemos de comemorar o nosso Pombal como “aexequo inter pares” já que “Primus” será talvez ambição a mais…embora, como lá dizia o poeta: O sonho comanda a vida.
Um abraço